Quando dizemos que o português tem origem no latim, não calculamos os meandros desta afirmação. Naturalmente, dizemos que a maior parte das palavras provém do latim. Mas não é só isso, não é só a estrutura da palavra que está em jogo. Também é ao latim que vamos buscar as desinências, isto é os elementos terminais que mudam na flexão das palavras:
Hora (L) deu hora (P), manum (L) deu mão (P), panem (L) deu pão (P), leonem (L) deu leão (P).
E também processionem (L) deu procissão, como extensionem deu extensão e abstentionem, abstenção. Ou ainda, collectionem deu coleção.
Agora, vejamos o que acontece para além do radical das palavras. Como se forma o plural destas palavras? Isto é, o que acontece à terminação destas palavras quando passam para o plural?
Porque é que manum deu mãos no plural, panem deu pães e leonem deu leões? Porque é que, em português, não usamos a mesma forma de plural e dizemos: mãos, pãos e leãos?
A razão vem diretamente da etimologia: …anum, …anem, …onem são no plural …anus, …anes, …ones. Estes plurais passam assim para …ãos, …ães e …ões em português.
Para quem sabe latim, é fácil saber o plural de muitas palavras.
Outro caso aflorado na aula é a terminação das palavras em “…ão”, que aceitam consoantes diferentes – …ssão, …são, …xão, …ção. (discussão, distensão, genuflexão, locução, etc.). A terminação da palavra em latim leva a que, em português, tenhamos esta variedade ortográfica que nos dá cabo da cabeça.
Para tudo ficar mais claro, concluamos o texto com as ditas palavras em latim:
– discussionem – discussão
– distensionem – distensão
– genuflexionem – genuflexão
– retentionem – retenção
NOTA: vejam a diferença entre tensionem (tensão) e tentionem (tenção), que em português deu origem a duas palavras com significado bem diferente.
Pois é: “quem não sabe latim fica assim”!
António Henriques