Desde pequenina, sempre ouvi dizer, como se fosse uma profecia:
«As pessoas, quando nascem, trazem o seu destino traçado».
Eu pergunto: «Será sorte ou destino?»
Na realidade, cada pessoa tem o seu modo de vida própria. Mas há uma grande diversidade de vivências diferentes, independentemente do que são. Poderão ser lutadoras, hábeis, empenhadas em conquistar o seu próprio espaço, por meios objetivos e dignos, mas os resultados dos seus esforços não correspondem aos propósitos pré-definidos, causando uma certa frustração ao sujeito em causa. E porquê? Há pessoas que vivem fustigadas por lágrimas causadas por doenças, pobreza, infortúnios, perdas de pessoas queridas sujeitas a mágoas e dores. A outras a vida oferece-lhes beleza, riqueza, alegria, tudo quanto é de bom, vivem em plena felicidade e luxo.
Perante estas situações, umas vivem com razões de lamento, normalmente com ar suplicante, dizem:
– Que pouca sorte!
Para outras a vida é um paraíso, têm razões para sorrirem e a felicidade está sempre presente. Não cultivam gestos de humanidade, são indiferentes a outras abordagens do mundo, desconhecem (ou fingem desconhecer) a existência de rostos onde se inscreve a miséria, a solidão, o sofrimento, a fome e o desespero.
Afinal, porque existem essas diferenças? Será por motivos de sorte ou destino? Será que existe mesmo a sorte? Será que existe mesmo o destino? Só sei que, na realidade, uns choram e outros riem. Creio que os que choram são tocados pela falta de sorte, levam uma vida pintada de cor cinzenta. Também sei que os que riem são bafejados com bastante sorte, e que a vida se lhes apresenta sempre com as cores do arco-íris.
No entanto, há situações a considerar: a sorte também pode ser conquistada através do trabalho, do esforço e sobretudo pela vontade de realização pessoal, perante a família e a sociedade. Mas a sorte também é fruto daquele que sabe duma forma inteligente e hábil escolher os caminhos mais bem direcionados, discernir escolhas, tomar decisões que implicam responsabilidade com toda a esperteza e encaminhar-se para o sucesso. Mas há outras situações que não têm nada a ver com a inteligência e esperteza e acontecem de forma espontânea, quase paradoxal, porque ninguém pode evitar doenças, mortes inesperadas, instável vida familiar, falta de recursos, diminuições físicas e exposição a todo o tipo de infortúnios. A mão humana não tem poderes nem capacidades para alterar o curso problemático dos sujeitos.
Então, essas pessoas vivem conformadas pelo dom da fé e acreditam que o seu sofrimento será um dia recompensado por uma luz que lhes pode oferecer o conhecimento da existência duma possível felicidade, que a vida sempre lhes negou.
Portanto, a pobreza é sinónimo da necessidade, da dependência de caridade, esmolas, proteção e súplicas. No nosso país, ainda neste século, sinalizamos essa trágica realidade, numa percentagem apreciável. Nos programas de televisão, continuamente passam imagens, sumamente comoventes, de crianças e adultos com o rosto e a alma decepados pelos maus tratos infligidos pelos seus iguais, quer dizer, pertencentes ao grupo dos humanos. Somos confrontados com abandonos de crianças de todas as idades, algumas até recém-nascidas, misérias sociais capazes de comover o mundo inteiro.
Sobre a criança que é abandonada à nascença, direi:
«É portadora duma vida que revela francamente um destino mal traçado». (Continua)
Rosa Natália
NOTA: Este texto não tem conclusão. Na aula, serviu de reflexão e conversa simples acerca do sentir de cada um. Deu-se relevo à palavra “sorte”, que marca por vezes a vida das pessoas. E rejeitou-se muito a palavra “destino” (sina), por sentirmos que temos liberdade para nos construirmos ou não, que somos sujeitos capazes de modificar a nossa personalidade, embora não dominemos todas as condicionantes. O ser humano é limitado, sujeito a desastres e dependente de situações sociais, que podem marcar o nosso dia-a-dia. Como dizia a Irene, «somos seres em permanente adaptação». AH